domingo, 29 de agosto de 2010

DNA Sintético

A maior descoberta da humanidade desde o fogo. A invenção mais importante (e mais controversa) desde a criação da bomba atômica. O início de uma nova era de prosperidade, saúde e desenvolvimento tecnológico para o homem - ou o começo de sua destruição. Foi assim que jornalistas, cientistas, filósofos e acadêmicos em geral receberam a proeza anunciada pelo geneticista Craig Venter: a criação em laboratório de uma forma de vida sintética. "Ficou provado que o mundo material pode ser manipulado para produzir o que chamamos de vida", diz Arthur Caplan, professor de bioética da Universidade da Pensilvânia. Até o Vaticano, mesmo fazendo as ressalvas de praxe, elogiou a pesquisa.

À primeira vista, essa forma de vida sintética não impressiona muito. Ela é só uma versão artificial da Mycoplasma mycoides - bactéria que causa doenças em bois e é conhecida desde o século 19. No laboratório, não faz muito mais que se alimentar e se multiplicar. Come como mycoides, vive como mycoides, morre como mycoides, se reproduz como mycoides. Bem, ela é uma mycoides. Qual é a grande novidade, afinal? A novidade é que essa humilde bactéria é o primeiro organismo vivo na face da Terra a funcionar com um genoma produzido artificialmente. Ou seja: o DNA que existe dentro dela foi construído em laboratório, com base num arquivo digital. "É a primeira forma de vida cujos pais são um computador", disse Craig Venter na entrevista em que apresentou a bactéria ao mundo.

Para gerar essa forma de vida, o DNA sintético teve de ser introduzido numa bactéria que já estava viva - cujo código genético foi substituído pelo genoma artificial. Ninguém conseguiu, ainda, gerar vida a partir de matéria inanimada. Mas a descoberta provou que é possível escrever DNA como se fosse um software, colocá-lo para rodar no hardware da vida (a célula), e disso obter uma nova forma de vida - que foi criada em laboratório e contém elementos definidos pelo homem. Vida artificial. Ou, se você preferir, vida sintética. Ela é filha de computadores. Mas também de um homem.

O Criador
Craig Venter. Genial e polêmico, esse pesquisador americano começou a se destacar nos anos 90, quando inventou um método mais rápido e barato para ler DNA. Então ele decidiu, por conta própria, sequenciar (ler) todo o genoma humano - código enorme, com 3,2 bilhões de letrinhas, que um consórcio internacional de cientistas já estava decifrando havia praticamente uma década. Mesmo saindo com todo esse atraso, Venter empatou com o outro grupo: finalizou a tarefa na mesma época, e gastando 90% a menos. Sua grande sacada foi descobrir que o DNA podia ser quebrado em pedaços e lido em ordem aleatória, o que agilizava o processo. Ele queria cobrar pelo acesso aos dados do DNA humano, o que gerou enorme polêmica na época. O sequenciamento do genoma deu um empurrão crucial à medicina e criou uma indústria de testes (pagando US$ 300, você pode ter seu DNA analisado em busca de predisposição a certas doenças), mas a ideia de Venter não decolou - como o outro grupo de cientistas liberou gratuitamente os dados, ele não teve escolha a não ser fazer o mesmo (não pôde vendê-los).

Mais ou menos nessa época, decidiu apostar em outro ramo: a biologia sintética. Mas, para isso, era preciso produzir um genoma. Em vez de partir do zero, o grupo de Venter decidiu copiar a sequência genética de uma criatura que já existisse na natureza: uma bactéria chamada Mycoplasma genitalium (que, como seu nome sugere, causa infecções genitais). Ela não é nada glamorosa, mas foi escolhida porque tinha o menor genoma conhecido na época, com "apenas" 500 mil letras. O DNA dessa bactéria foi escaneado. E, em janeiro de 2008, a equipe conseguiu montar uma versão sintética dele, manipulando adenina, guanina, timina e citosina - as 4 substâncias químicas que formam o genoma de todos os seres vivos (e cuja versão artificial é produzida por empresas de biologia molecular).

Agora que tinham produzido DNA artificial, os cientistas precisavam resolver a outra parte do desafio: transformá-lo numa criatura viva. Como até hoje ninguém descobriu como gerar vida a partir de matéria inanimada, a solução foi implantar o DNA artificial numa bactéria "hospedeira", cujo genoma seria suprimido. No começo, não funcionou. A equipe de Venter tentou, tentou e tentou, por mais de um ano, mas o implante nunca dava certo. O processo de fabricação do DNA gerava erros no código genético, que impediam a bactéria de funcionar. Ela simplesmente morria. Venter percebeu que o que supostamente era uma vantagem (a simplicidade genética da M. genitalium) na verdade era um problema - e que uma bactéria maior, com genoma mais extenso, seria menos suscetível aos inevitáveis erros na síntese do DNA. A equipe recomeçou todo o processo, só que com a Mycoplasma mycoides, de genoma maior (1 milhão de letras). Deu certo.

Eles produziram uma versão artificial do DNA da mycoides, implantaram em outra bactéria, e bingo: ela se transformou em mycoides e começou a se reproduzir, gerando descendentes com 100% de DNA artificial. Os cientistas se deram ao luxo, inclusive, de fazer algumas alterações no código genético. Inseriram 4 mil letras no genoma, escrevendo nele - de forma codificada, usando pedaços de adenina, guanina, timina e citosina - uma série de mensagens. Uma passagem do romance Retrato do Artista Quando Jovem, de James Joyce ("Viver, errar, cair, triunfar, recriar a vida a partir da vida"). Um trecho do livro American Prometheus, que fala sobre a criação da bomba atômica pelo físico J. Robert Oppenheimer ("Não veja as coisas como elas são, e sim como elas poderão ser"). E uma frase atribuída ao físico Richard Feynman, outro dos inventores da bomba: "O que não posso criar, não posso compreender". A fixação de Craig Venter com a bomba atômica não é coincidência. O mundo nunca mais foi o mesmo depois que o homem aprendeu a separar e fundir o átomo. E a biologia artificial promete uma transformação ainda mais profunda.

A nova vida
Por enquanto, a vida sintética é apenas uma demonstração de laboratório. Ela só será realmente útil quando os cientistas conseguirem mexer mais profundamente no DNA artificial. Se quisermos criar bactérias capazes de desempenhar funções úteis, como produzir combustíveis e curar doenças, precisaremos dar a elas os meios de fazer isso: os genes. Alguns dos genes necessários já existem na natureza - há micro-organismos capazes de comer plástico e fabricar hidrogênio, por exemplo. Esses genes poderiam ser turbinados e inseridos em criaturas com DNA artificial.

Falta muito para chegar a esse ponto. Mas poucos duvidam de que isso possa acontecer. "A ideia parece razoável", avalia o geneticista Marcelo Nóbrega, na Universidade de Chicago. "As bactérias se tornariam minirrefinarias de combustível, uma fonte renovável e não poluente de energia." É tão razoável, na verdade, que o Departamento de Energia dos EUA decidiu investir no instituto de Venter para que ele faça tudo isso acontecer o mais breve possível.

E não custa lembrar que Venter e sua equipe não são os únicos a trabalhar nisso. Um dos rivais mais fortes é o cientista David Berry, líder da empresa biotecnológica LS9, que está desenvolvendo micro-organismos capazes de fabricar um substituto do petróleo. Outro concorrente é a empresa italiana ProtoLife, que quer ir além do esforço de Venter e construir tudo na raça - quer dispensar a bactéria hospedeira e construir uma bolhinha artificial que sirva como embalagem para sua forma de vida sintética. Uma estratégia parecida foi adotada pelo físico Steen Rasmussen, do Laboratório Nacional de Los Alamos, nos EUA. Ele pretende partir de elementos básicos (como uma versão alternativa do DNA chamada PNA, mais ácidos graxos e moléculas sensíveis à luz) e então reuni-los, na esperança de que eles possam, sozinhos, iniciar um metabolismo primitivo. Em vez de fazer o caminho seguido por Venter, que é pegar células já vivas e programá-las com DNA artificial, a ideia aqui é começar de baixo, e fazer uma versão artificial da própria célula. É uma estratégia mais complicada - e mais ambiciosa. "Como estamos começando do zero", diz Rasmussen, "podemos projetar nossa protocélula para fazer coisas que as células vivas não podem fazer. Poderíamos torná-la capaz de sobreviver em qualquer ambiente: tóxico, radioativo etc." Segundo ele, essa técnica também é mais segura. "As protocélulas podem ser projetadas para não interagir com o ambiente." Ou seja: em tese, elas poderiam conter mecanismos de segurança mais avançados (por exemplo, a incapacidade de sobreviver na ausência de um determinado gás que só exista em laborátorio), para garantir que não causassem danos se escapassem ao controle humano. Como medida de segurança, Venter propõe o chamado "genoma mínimo" - quer criar bactérias que possuam pouquíssimo DNA, com 400 genes ou menos, e que por isso sejam frágeis, incapazes de sobreviver fora de condições controladas.

Os micróbios artificiais seriam cultivados em laboratórios, fábricas e usinas construídas especialmente para isso (cuja viabilidade econômica, aliás, será um grande desafio para que essa tecnologia seja usada em larga escala). Mas, cedo ou tarde, é provável que acabem escapando. E as bactérias trocam de genes entre si com mais frequência do que crianças trocam figurinhas da Copa do Mundo. Mesmo que você crie um micróbio incapaz de sobreviver sem ajuda, ele pode acabar entrando em contato com uma bactéria natural, trocar genes com ela, e readquirir essa capacidade. E aí? Caos.

Imagine uma bactéria originalmente programada para biodegradar plástico que escape no mundo. Ou uma que comece a produzir hidrogênio (altamente inflamável) sobre as bocas de nossos fogões. E por aí vai. Não é difícil pensar em tragédias que têm como inspiração a vida sintética."Ninguém pode estar certo das consequências de fazer novas formas de vida, e devemos esperar o inesperado e o indesejado", argumenta o filósofo Mark Bedau, da Universidade Reed. O assunto está começando a mobilizar os pensadores do mundo, e já existe quem defenda um controle rígido da biologia sintética - que passaria a ser regulada por agências e tratados semelhantes aos que hoje tentam limitar a proliferação de armas nucleares. A genética está a dois passos de começar uma nova era. Se isso será bom ou ruim? Vamos ter de descobrir na prática. 


Vida em 7 etapas
Entenda como a equipe do americano Craig Venter criou uma célula com DNA sintético

1. Não comece do zero
Ninguém sabe redigir um genoma inteiro a partir do zero. Por isso, os cientistas partiram de uma bactéria que já existe na natureza: a M. mycoides. Ela foi escolhida porque tem um genoma considerado pequeno, com "apenas" 1 milhão de letras (o genoma humano é 3 200 vezes maior).

2. Leia o DNA original
Os cientistas escaneiam o DNA dessa bactéria. Para fazer isso, aplicam enzimas que quebram o DNA em pequenos pedaços - que então são submetidos a um campo magnético, lidos com raio X e digitalizados. É a mesma técnica que Craig Venter usou para decifrar o genoma humano.

3. Altere no computador
Com a sequência genética digitalizada, os cientistas podem editá-la no computador - como se fosse um arquivo de Word. Eles rescreveram trechos do DNA, incluindo 4 mil novas letras genéticas - que incluem informações como o nome da empresa de Venter e trechos de livros.

4. Transforme em molécula
Hora de transformar o código digital em genoma. Para isso, os cientistas manipulam as 4 substâncias químicas que compõem o DNA na natureza - adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C). Cada uma delas corresponde a uma letra do genoma artificial - que é montado em blocos de 1 000 letras.

5. Insira num fungo
Os blocos são injetados em fungos, que começaram a juntá-los em pedaços maiores. Os fungos fazem essas emendas aleatoriamente, sem critério. Por isso, os cientistas precisam tentar o procedimento muitas vezes - até que, por pura tentativa e erro, os fungos remontem os pedaços de DNA na ordem correta.

6. Repita o processo
Conforme os fungos vão acertando a montagem do DNA, o genoma vai ficando maior. Primeiro, eles juntaram blocos de 1 000 letras genéticas em grupos de 10 mil. Depois, 100 mil. Por fim, 1 milhão de letras - elas formam um cromossomo sintético que contém o DNA criado pelos cientistas no computador. 



7. Implante numa célula
O cromossomo é injetado num ser vivo - no caso, uma bactéria chamada M. capricolum. Sob o controle do genoma artificial, essa bactéria se transforma numa nova espécie, cujas características são definidas pelo DNA artificial. Está criada uma forma de vida sintética.

Para que serve tudo isso?
A criação de novas formas de vida pode revolucionar nossa relação com a biosfera terrestre

Produção de combustíveis
Os organismos sintéticos poderiam ser manipulados para produzir hidrogênio - um combustível altamente eficiente, e cuja queima não polui o ambiente. Na natureza, já existem genes capazes de fazer isso: estão presentes em determinadas bactérias marinhas, que são capazes de "comer" metano e excretar hidrogênio como resultado.

Cura de doenças
A ideia é conceber bactérias que ajudem a combater certos tipos de doenças, como câncer e infecções resistentes a antibióticos. Bastaria criar um microorganismo programado para se alimentar de determinada proteína (que só exista nas células que você deseja destruir, como as cancerosas) e injetá-lo no organismo.

Combate ao aquecimento global
O processo de fotossíntese é a transformação de água, CO2 e luz em oxigênio e açúcar. Com a engenharia genética, talvez seja possível criar micróbios que façam a fotossíntese com mais eficiência do que as plantas - e removam mais CO2 da atmosfera, reduzindo o efeito estufa e brecando o aquecimento global.

Fim do lixo
Os lixões e os oceanos do mundo estão cheios de plástico - que levará centenas de milhares de anos para se degradar e desaparecer. Mas na natureza já existe uma bactéria, a Flavobacterium, capaz de comer um plástico: náilon. A biologia sintética poderia aperfeiçoar essa capacidade, criando um micro-organismo que pudesse digerir todos os tipos de plástico.

Acidente biológico
Se as bactérias comedoras de CO2 escapassem do controle, por exemplo, e consumissem todo esse gás da atmosfera terrestre, a temperatura no planeta cairia para -18 C. Os cientistas dizem que os organismos artificiais serão propositalmente frágeis, incapazes de sobreviver fora de determinadas condições. Mas sempre existe a possibilidade de que eles sofram mutações - e se transformem em pragas incontroláveis.

Guerra e terrorismo
Lembra dos ataques terroristas com a bactéria antraz, que assustaram os EUA em 2001? Com a biologia sintética, será possível aumentar a potência de armas como essa (desenvolvendo um antraz mais facilmente transmissível, por exemplo). Ou então criar vírus artificiais altamente letais e resistentes, contra os quais não exista nenhum tipo de tratamento conhecido. 
Fonte: Superinteressante

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O Amor Esquece de Começar

Pesquisando sobre autores gaúchos deparei-me com uma forma inusitada e genial de fazer poesia com o livro "O Amor Esquece de Começar" do autor Fabrício Carpinejar. Martha Medeiros recomenda na apresentação da obra: "Entre o nonsense e a realidade, Fabricio Carpinejar é mestre em acertar no alvo, ora nos emocionando muito, ora nos emocionando bastante - as duas únicas reações que se pode ter diante deste livro escrito às ganhas".
 
O escritor flagra pequenos detalhes adormecidos do cotidiano e faz comparações inusitadas como a quebra do tampo do fogão com os problemas de casamento. Utiliza as duas mãos para atravessar a linguagem. De um lado, a poesia, do outro, a crônica. Explora o universo feminino, descreve quando uma mulher chega ao auge em uma relação sexual, o que ela quer, exalta a amizade da velhice, desarma os preconceitos masculinos, mostra qual a gíria entre os homens, explica que a última colher dada a um filho nunca é a última e desmoraliza expressões e eufemismos como 'dar o tempo' e 'ceder'.  A mãe é uma das figuras mais exaltadas em seu texto. "Uma mulher quer dançar para os outros homens, para chamar o seu para perto. Uma mulher quer ser restituída de suas falhas, quer que acreditem nela quando mente, que duvidem dela quando fala a verdade", expressa um dos textos. A rotina não será mais a mesma depois da coletânea, ninguém levantará os estilhaços de vidro de um copo sem pensar que  "por mais que se recolha os fragmentos, algo ficará piscando no chão no dia seguinte. O vidro faz seu colar para vender ao sol." 


Em seu livro,  o amor é uma surpresa e uma confirmação. Um renascimento para quem até então não o encontrava. Um espelho a mostrar a beleza e o vigor a quem sempre soube identificá-lo. "O Amor Esquece de Começar" é esse espelho. A mulher, principal interlocutora de seus textos certeiros, não está sozinha. O homem também pode participar dessas revelações que, apontadas numa direção, atingem todos e tudo. O amor, afinal, é o sentido da vida e o conforto para a assustadora dimensão do universo. "Quero recuperar o romantismo, uma visão cristalina e verdadeira das relações amorosas, um cuidado na fala, a sedução", revela Carpinejar. "Sem idealismo, mas com idealização. A expectativa e a confiança fazem bem ao amor e não podem ser abolidos. Desejo, com as mulheres, o consenso das mãos durante o dia e dos pés durante a noite." 


"Uma biblioteca desarrumada não significa que é menor. Estantes com filas duplas não sinalizam desordem. Um livro que não se encontra não está perdido. Não achar alguma coisa é mexer em obras esquecidas e ler o que não se esperava. Não sou contra a catalogação. Nada disso. É que livros lidos são naturalmente livros fora de ordem. Escapam do crivo, deitam em dormitório alheio, se misturam com ansiedade. Duvido de uma biblioteca ordenada em excesso, impecável, limpa. Parece que a única leitora é a traça. A vida não deixa nada em seu lugar. Como ler sem contrariar o rumor alfabético? Como viver sem contradição? O mesmo posso pensar dos amores. Desejamos ao longo dos dias ter um casamento regulado, com todos os volumes cadastrados e que sirva mais como um móvel para decoração do que uma escada de leitura. Amor, como uma biblioteca, não é posse, mas despertence. Quanto mais leio mais perco as certezas do começo. Quanto mais amo mais apresso o final. Um livro não dirá onde estamos, uma paixão não consola, ambos apontarão para onde podemos ir dentro do corpo.

É possível viver dois amores ao mesmo tempo? Sim, é possível viver até três amores ao mesmo tempo, porém o esgotamento nervoso chega junto. Desde que um amor não seja a migalha do outro. Desde que o amor não seja a falta de solidão, e sim a solidão assumida. Desde que o amor não seja a segurança do egoísmo e sim a insegurança do diálogo. Desde que um amor não seja o complemento do outro. Pois amores não se completam, se bastam. Não adianta somar duas carências para gerar uma terceira. Dois amores são possíveis no início, para se desentenderem logo em seguida. O amor que é forte, luminoso, não permite concorrência. Amor é naufrágio, nem todos encontram madeira boiando para voltar a si. Dois amores são possíveis ao mesmo tempo porque um deles será o proibido. Porém, o proibido pode ser transar com a esposa, não a amante, e quem dançará sozinha depois é a amante. Difícil de compreender? Permanecer no casamento ou na estabilidade, desde que se amem, é hoje a mais alta transgressão. Aventurar-se fora de seus domínios cheira a regra. Não existe roteiro pronto. Assim como o marido pode segurar a vela de seu enterro e as duas arranjarem coisa melhor pela frente. O amor não está em uma instituição, mas na capacidade de suplantá-la.

Amor não se mede, se confunde. É impraticável comparar relacionamentos como ofertas de lojas. Um amor que não pode ser comparado é difícil de esquecer (ainda que a separação aconteça). Aquele que já permite comparação demonstra ser pouco consistente (ainda que os dois fiquem juntos). A gente ama para quê? Para não avaliar o amor. Não conseguir acompanhá-lo é quando vai bem. Quando se começa a ter consciência do certo ou do errado é aviso prévio. Sintomático que os casais peçam conselhos aos amigos para fazer em seguida tudo diferente. Amor muda as regras de propósito, muda o telefone, muda o endereço. Quem não está jogando não entenderá. É feito somente para jogar, não ser assistido. O mistério é não entendê-lo a ponto de preveni-lo. Prevenir o amor é matar a capacidade de aprender com suas conseqüências."

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Horsetail Falls - Cachoeira de fogo

Horsetail Falls é uma pequena cachoeira sazonal, que aparece somente no final do inverno e início da primavera. A cachoeira está localizada no Parque Nacional de Yosemite, um  parque famoso pela beleza de suas cachoeiras, localizado nas montanhas da Serra Nevada, Califórnia. 

A cachoeira tem como tela de fundo, uma impressionante parede de granito que, com luz e hora certa, proporciona fotos incríveis. Ela aparece em alguns dias de fevereiro, quando o céu está claro e os últimos raios solares do dia caem de forma especial sobre a cachoeira, iluminando suas águas com um brilho dourado, ganhando uma aparência de fogo.

Um momento único e maravilhoso para os fotógrafos, que esperam ansiosos pelo espetáculo que não dura mais de um minuto. Aprecie fotos da beleza de Horsetail falls,  a cachoeira de fogo do parque Yosemite.


 







sexta-feira, 6 de agosto de 2010

AS ROSAS DE BOBBY

Bobby começava a sentir frio, sentado no quintal, sob a neve Bobby não calçava botas; não gostava. E além disso não tinha uma. O tênis desgastado tinha alguns furos.

Bobby já estava no quintal por quase uma hora. Tentava encontrar uma idéia para o presente de Natal de sua mãe. Agitou a cabeça quando pensou: isto é inútil, mesmo que me ocorra uma idéia, não tenho dinheiro para comprar.

Desde que seu pai os tinha abandonado, há três anos, a família de cinco pessoas vinha sofrendo muito. Não porque sua mãe não se esforçasse. Apenas nunca conseguia o suficiente. Trabalhava à noite no hospital, mas o pequeno salário que ganhava não resolvia.

O que faltava para a família em dinheiro e bens materiais, era compensado pelo amor e pela união da família. Bobby tinha duas irmãs mais velhas e uma mais nova. Cuidava da casa na ausência da mãe. As três irmãs já tinham bonitos presentes para sua mãe.
Era véspera de Natal e ele não tinha nada.

Enxugando uma lágrima nos olhos, Bobby chutou a neve e começou a andar para uma rua onde ficavam os shoppings e as lojas. Não era fácil ser um garoto de seis anos sem um pai, especialmente quando precisava de um homem para conversar.

Bobby andou de loja em loja, olhando cada vitrine decorada. Tudo parecia tão bonito e tão fora do alcance. Estava começando a escurecer e Bobby voltou-se, relutante, para a caminhada de volta. Então, de repente, seus olhos encontraram o brilho dos últimos raios do sol que refletiam em algo no meio-fio. Abaixou-se e descobriu uma brilhante moeda de dez centavos. Nunca se sentira tão rico como naquele momento.

Quando guardou o seu tesouro, um calor espalhou-se por todo o seu corpo e entrou na primeira loja que viu. Sua excitação transformou-se rapidamente em frio quando o vendedor lhe disse que não poderia comprar nada com apenas uma moeda de dez centavos.

Ele entrou em uma floricultura. Quando o dono perguntou se poderia lhe ajudar, Bobby mostrou a moeda de dez centavos e perguntou se poderia comprar uma flor para presente de Natal de sua mãe. O dono da loja olhou para Bobby e sua moeda de dez centavos. Então pôs a mão sobre o ombro de Bobby e disse-lhe:
- Espere um pouquinho aqui e verei o que posso fazer para você.

Enquanto esperava, Bobby admirava as flores na loja. Mesmo sendo um jovem menino, sabia que as mães e as meninas gostavam de flores. O som da porta que fechava-se com a saída do último cliente, trouxe Bobby de volta à realidade. Na loja vazia, Bobby começou a se sentir sozinho e receoso.

O dono da loja voltou trazendo um arranjo de doze rosas vermelhas de longas hastes amarradas por um grande laço prateado. O coração de Bobby disparou enquanto o homem ajeitava as flores delicadamente em uma caixa branca.
- São dez centavos, meu jovem, disse o dono da loja levando a mão para pegar a moeda.
Lentamente, Bobby moveu sua mão para entregar sua moeda. Poderia ser verdade? Ninguém lhe venderia algo tão bonito por dez centavos!
Sentindo a relutância do menino, o dono da loja acrescentou:
- Me ocorreu ter algumas rosas para vender por dez centavos. Você gostaria?
Desta vez Bobby não hesitou e quando o homem colocou a caixa em suas mãos, soube que era verdade.
Saindo da loja, Bobby ouviu o dono da loja dizer:
- Feliz Natal, filho.

Nisso, entra a esposa do proprietário da loja, que estava nos fundos e pergunta:
- Onde estão as rosas que você estava preparando?
Olhando pela vitrine e com lágrimas nos olhos, respondeu:
- Uma coisa estranha me aconteceu esta manhã. Quando eu estava abrindo a loja, eu pensei ouvir uma voz que me dizia para reservar uma dúzia de minhas melhores rosas para um presente especial. Eu não entendi o que acontecia mas, de qualquer maneira, eu as guardei. Então, há alguns minutos um pequeno menino entrou na loja e queria comprar uma flor para sua mãe com uma moeda de dez centavos. Quando o olhei, eu me vi, muitos anos atrás, quando eu não tinha nenhum dinheiro para comprar um presente de Natal para minha mãe. Um homem barbudo, que eu nunca tinha visto, me parou na rua e me deu dez dólares. Quando eu vi o menino, eu soube de quem era a voz, e lhe arranjei uma dúzia de minhas melhores rosas.

O proprietário da loja e sua esposa abraçaram-se firmemente e fecharam a loja. E, enquanto caminhavam pela noite fria, de alguma forma não sentiam frio.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Telescópio Espacial - Buckyballs

O Telescópio Espacial Spitzer descobriu no espaço, pela primeira vez, moléculas de carbono conhecidas como "buckyballs", uma espécie de bola de futebol formada por 60 átomos de carbono. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]

O Telescópio Espacial Spitzer, da NASA, descobriu no espaço, pela primeira vez, moléculas de carbono conhecidas como "buckyballs". Buckyballs são moléculas em forma de bola de futebol que foram observadas pela primeira vez em laboratório há apenas 25 anos. Elas devem seu nome à semelhança com as cúpulas geodésicas do arquiteto Buckminster Fuller, que têm círculos interligados na superfície de uma meia-esfera. Os cientistas já acreditavam que elas poderiam existir flutuando no espaço, mas ninguém havia conseguido detectá-las até agora.

"Nós encontramos aquelas que são agora as maiores moléculas existentes no espaço," disse o astrônomo Jan Cami, da Universidade de Western Ontario, no Canadá. "Estamos particularmente entusiasmados porque elas têm propriedades únicas que as torna elementos importantes para todos os tipos de processos físicos e químicos acontecendo no espaço."

As buckyballs são formadas por 60 átomos de carbono dispostos em estruturas esféricas tridimensionais. Seus padrões alternados de hexágonos e pentágonos coincidem com o desenho típico de uma bola de futebol. Os astrônomos descobriram também, pela primeira vez no espaço, a parente mais alongada das buckyballs, conhecida como C70. Estas moléculas, constituídas de 70 átomos de carbono, têm uma forma ovalada, mais parecida com uma bola de rugby. Os dois tipos de moléculas pertencem a uma classe conhecida oficialmente como buckminsterfulerenos, ou simplesmente fulerenos.

As bolas de carbono foram localizadas em uma nebulosa planetária chamada Tc 1. Nebulosas planetárias são restos de estrelas como o Sol, que expelem suas camadas exteriores de gás e poeira à medida que envelhecem. Uma estrela quente e compacta, ou anã branca, que está no centro da nebulosa, ilumina e aquece essas nuvens de poeira estelar. As buckyballs foram encontradas nessas nuvens, talvez refletindo uma fase curta da vida da estrela, quando ela arremessa para o espaço uma nuvem de material rico em carbono.

As buckyballs vibram em uma grande variedade de modos - 174 maneiras diferentes de sacudir, para ser mais exato. [Imagem: NASA/JPL-Caltech/University of Western Ontario]
Os astrônomos usaram os instrumentos de espectroscopia do Spitzer para analisar a luz infravermelha da nebulosa planetária, observando então as assinaturas espectrais das buckyballs. Estas moléculas estão aproximadamente a temperatura ambiente, a temperatura ideal para emitir os distintos padrões de luz infravermelha que o Spitzer consegue detectar.

Segundo Cami, o Spitzer olhou para o lugar certo na hora certa. Um século mais tarde, e as buckyballs poderiam estar frias demais para serem detectadas. As buckyballs vibram em uma grande variedade de modos - 174 maneiras diferentes de sacudir, para ser mais exato. Quatro desses modos de vibração fazem as moléculas absorver ou emitir luz infravermelha. Todos os quatro modos foram detectados pelo Spitzer.

Os astrônomos estudaram os dados, um espectro como o mostrado na figura, para identificar as assinaturas, espécies de impressões digitais das moléculas. Os quatro modos de vibração das buckyballs estão indicados pelas setas vermelhas. Da mesma forma, o Spitzer identificou os quatro modos de vibração das moléculas C70, indicados pelas setas azuis.

Bibliografia:

Detection of C60 and C70 in a Young Planetary Nebula
Jan Cami, Jeronimo Bernard-Salas, Els Peeters, Sarah Elizabeth Malek
Science
22 July 2010
Vol.: Science Express
DOI: 10.1126/science.1192035

sábado, 31 de julho de 2010

Macrofotos do Pólen

O pólen, proveniente da antera, parte da estrutura masculina (androceu) chega através de um agente polinizador (que pode ser um inseto, o vento, aves, etc.) até ao óvulo, parte feminina (gineceu) de uma outra flor ou da mesma flor caso ela seja hermafrodita. Para alcançar o óvulo, o pólen passa pelo estigma, estilete, até chegar ao ovário onde finalmente encontrará o óvulo. O óvulo fecundado pelo grão de pólen gera as sementes e o ovário desenvolve-se no pericarpo, que é a parte carnuda da fruta. O que produz a fecundação é o pólen, cujas imagens fantásticas, feitas por microscópio, nos encantam pela beleza e diversidade.


O pólen (do grego "pales" = "farinha" ou "pó") é o conjunto dos minúsculos grãos produzidos pelas flores das angiospermas (ou pelas pinhas masculinas das gimnospérmas) que são os elementos reprodutores masculinos ou microgametófitos, onde se encontram os gâmetas que vão fecundar os óvulos que posteriormente irão se transformar em sementes. São sementes de pólén em conjunto produtivos.


O grão de pólen ou também denominado de micrósporo, representa a estrutura reprodutiva masculina das plantas fanerógamas, e são produzidos por meiose no microsporângio. Normalmente são revestidos por paredes de celulose ornamentadas, característica de cada família ou mesmo auxiliando na identificação das espécies de plantas. 
De forma geral são pequenos e arredondados, alguns alados, contendo projeções que proporcionam o processo de polinização anemofílica (realizada pelo vento) ou demais estruturas adaptadas ao ambiente, especializadas conforme a dispersão na água (polinização hidrófila) ou através de atrativos a insetos (polinização entomófila). 


No interior de um grão de pólen localiza-se um gametófito masculino (microprótalo) imaturo. Quando esse atinge a flor portadora de estrutura reprodutiva feminina (estilete, estigma e ovário) o microprótalo nele contido se desenvolve e forma o tubo polínico por onde descem dois núcleos espermáticos. Um desses núcleos fecunda a oosfera (formando o embrião) e o outro se funde aos núcleos polares no interior do óvulo formando o albúmen (tecido nutritivo triplóide).


terça-feira, 27 de julho de 2010

Incríveis fotos sem Photoshop

Hoje em dia com as ferramentas disponíveis é possível fazer qualquer tipo de modificação em uma foto e com isso perdemos um pouco a referência do que é real e do que foi corrigido. Felizmente a fotografia através da captação de diferentes ângulos continua sendo uma arte ainda utilizada por muitos fotógrafos e trago para vocês uma seleção de fotos que por mais incrível que pareça, não foram modificadas no Photoshop. 


Três copos de vinho servidos na Torre de Pisa.
(Na verdade, o fotógrafo inclina a mesa e a câmara no mesmo ângulo).

O marco mais famoso de Paris sobre a paisagem é o suporte perfeito para fazer essa menina parecer um gigante em pé com uns 324 m (1.063 pés) de altura. O ângulo da câmara baixa e grande profundidade de campo fazem o resto do trabalho.
Andar sobre a água na Indonésia. (Tomada de 4 segundos de exposição)
Por mais doloroso que isso possa parecer, esta é uma foto de verdade. Júlio Aparicio, um dos matadores mais famosos da Espanha, foi chifrado na garganta durante uma tourada. O incidente ocorreu durante o Festival de São Isidro, considerado o mais importante evento no calendário de touradas, na Arena Plaza de Toros de Las Ventas em maio de 2010. O matador sobreviveu ao ataque, mas o touro foi morto após o incidente.
Fotografia tirada com telefone celular de uma menina em sua bicicleta em frente ao Palácio Real em Amsterdã, refletido em uma poça. Sem edição, sem truques, sem Photoshop. Esta foto foi escolhida como “Foto do dia” no Metro Photo Challenge e apresentado na versão impressa do jornal Metro.

O amor está no ar, ou neste caso, sobre a Terra. Esta ilha em forma de coração parece obra do homem, mas na verdade é uma obra da natureza e só recentemente foi destaque pelo Google Earth. Esta bonita ilha croata, alinhada por todos os lados com areias douradas, está localizada no Zadarski Kanal (Canal Zadar) entre Zadar e Ilha de Pasman.

As listras verticais + listras horizontais = camisa xadrez (por Rene Maltete, o fotógrafo francês (1930-2000) – a foto é chamado de “Rayures”, graças Xavi!)
Existe um lugar mágico, na Bolívia, chamado Salar de Uyuni, onde você pode tirar fotos incríveis como estas.
Isso não é Photoshop – é uma fotografia real da maior cadeira do mundo, na praça de Manzano, Itália. (Manzano é uma cidade de fabricantes de cadeira).

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Atividade Cerebral

Estudo revela que o córtex cerebral acelera logo antes do óbito. Isso pode explicar as experiências extracorpóreas.

por Bruno Garattoni - Revista Superinteressante
Entrar num túnel de luzes. A sensação de sair do próprio corpo. Encontrar parentes e amigos já falecidos. Muitas pessoas que estiveram perto da morte relatam ter passado por experiências como essas, que a ciência nunca conseguiu explicar. Mas um estudo impressionante, que pela primeira vez revelou o que acontece no cérebro durante a morte, parece ter começado a desvendar o mistério.

Usando um aparelho de eletroencefalograma, um grupo de médicos monitorou a atividade cerebral de 7 pessoas enquanto elas morriam. Todas eram pacientes terminais, entre 34 e 74 anos, que sofriam de cirrose, falência múltipla dos órgãos, septicemia, insuficiência cardíaca ou câncer. Os doentes estavam sob efeito de sedativos e só sobreviviam com a ajuda de aparelhos - que, a pedido de suas famílias, foram desligados.

A atividade cerebral dos pacientes ia ficando cada vez menor. Mas, nos últimos momentos antes da morte, o córtex cerebral (área responsável pela consciência) simplesmente disparava, e permanecia 30 a 180 segundos num nível muito mais alto, antes de cessar de vez. Isso acontece porque, quando os neurônios ficam sem oxigênio, perdem a capacidade de reter energia e começam a disparar em sequência - num efeito dominó que poderia provocar alucinações. "Isso pode explicar as experiências extracorpóreas relatadas por pacientes que quase morreram", afirma o estudo, assinado por 4 médicos da Universidade George Washington.

sábado, 24 de julho de 2010

Forma na Arquitetura - Oscar Niemeyer

 Excertos do livro de Oscar Niemeyer com publicação em 1978. 

"Minha idéia, ao escrever este pequeno texto, foi definir meu pensamento sobre o problema da forma na arquitetura, assunto que constitui, a meu ver, um equívoco lamentável ampliado pelo funcionalismo, utilizado pelos pequenos grupos que dele se servem até hoje. É problema que me ocupou por toda a vida e no qual intervim quando, em 1940, projetei as obras da Pampula, em Belo Horizonte. (...) A forma evoluiu na arquitetura em função das novas técnicas e dos novos materiais que lhe dão aspectos diferentes e inovadores.

Primeiro, foram as formas robustas que as construções em pedra e argila obrigavam; depois, surgiram as abóbadas, os arcos e as ogivas, os vãos imensos, as formas livres e inesperadas que o concreto permite e os temas modernos solicitam.
Diante dessa evolução contínua e inevitável e dos programas que surgem, criados pela vida e pelo progresso, o arquiteto vem concebendo, atráves dos tempos, o seu projeto: frio e monótono ou belo e criador, conforme seu temperamento e sensibilidade. Para alguns, é a função que conta; para outros, inclui a beleza, a fantasia, a surpresa arquitetural que constitui, para mim, a própria arquitetura.

E essa preocupação de criar beleza é, sem dúvida, uma das características mais evidentes do ser humano, em êxtase diante desse universo fascinante em que vive. E isso encontramos nas épocas mais remotas, com o nosso ancestral longínquo a pintar as paredes de sua caverna, antes mesmo de construir o seu pequeno abrigo.

E o mesmo se repete pelos tempos afora, a partir das pirâmides do Egito. Arquitetura-escultura, forma solta e dominadora sob os espaços infinitos. Sobre a beleza e a forma plástica na arquitetura lá pelo ano de 36, quando iniciei minha vida de arquiteto e a arquitetura contemporânea se fixava entre nós com o funcionalismo pontificando, recusando a liberdade de criação e a invenção arquitetural sempre presentes nos grandes períodos da arquitetura. 

Foi o tempo da planta de dentro para fora, do ângulo reto, da máquina de habitar, da imposição dos sitemas construtivos, imitações funcionalistas que não me convenciam ao olhar as obras do passado tão cheias de invenção e lirismo. Não podia compreender como, na época do concreto armado que tudo oferecia, a arquitetura contemporânea permanecesse com um vocabulário frio e repetido, incapaz de exprimir aquele sistema em toda a sua grandeza e plenitude.

Recordava, então, os velhos períodos, quando, limitado por uma técnica ainda incipiente, o arquiteto penetrava, corajoso, no caminho do sonho e da fantasia. Mas a arquitetura contemporânea baseava sua presença na técnica construtiva que tudo devia modificar, apoiando-se no funcionalismo para realizar a metamorfose desejada: substituir as antigas fachadas pelos grandes painéis de vidro; as grossas paredes de alvenaria pelas finas colunas de concreto; os telhados, os frontões e outros elementos que compunham as coberturas pelo terraço-jardim e os espaços, antes ocupados pelos edifícios, pelos pilotis. E o funcionalismo se transformou na sua arma preferida, recusando a liberdade de concepção com seu rigorismo estrutural opressivo.

Durante os primeiros tempos, procurei aceitar tudo isso como uma limitação provisória e necessária, mas depois, com a arquitetura contemporânea vitoriosa voltei-me inteiramente contra o funcionalismo, desejoso de vê-la integrada na técnica que surgira e juntas caminhando pelo campo de beleza e da poesia.

E essa idéia passou a dominar-me, como uma deliberação interior irreprimível, decorrente talvez de antigas lembranças, das igrejas de Minas Gerais, das mulheres belas e sensuais que passam pela vida, das montanhas recortadas esculturais e inesquecíveis do meu país. "Oscar você tem as montanhas do Rio dentro dos olhos", foi o que um dia ouvi de Le Corbusier. 

Mas, não raro, era a forma abstrata que me atraía, pura e delgada, solta no espaço à procura do espetáculo arquitetural. E nela me detinha, conferindo-a tecnicamente, certo de que alguns teriam empenho em analisá-la, com essa vocação para a mediocridade que não permite concessões nem obra criadora. 

E isso explica minha atuação diante das obras de Pampulha, apesar de recém-saído da escola de arquitetura, mas já tocado por essa vontade imperiosa de contestação e desafio. E Pampulha surgiu com suas formas diferentes, suas abóbadas variadas, com as curvas da marquise da Casa do Baile e provocarem os tabus existentes.

Casa do Baile, Belo Horizonte, 1943.

Igreja da Pampulha, Belo Horizonte, 1943.

                                             
Mas não devo falar de Pampulha sem antes me referir a certos falos que a precederam, sem lembrar que outros projetos - já modernos - começavam a aparecer, embora despidos do espírito radical e renovador que ela exibia.

(...)
Mas se o prédio do Ministério, projetado por Le Corbusier, constituiu a base do movimento moderno no Brasil, é a Pampulha - permitam-me dizê-lo - que devemos o início da nossa arquitetura, voltada para a forma livre e criadora que até hoje a caracteriza. Durante anos acompanhei com JK as obras da Pampulha, visitando juntos, altas horas da noite - como vinte anos depois ocorreu em Brasília - os canteiros de serviço, surpreso com o seu entusiasmo a imaginar Pampulha já construída e o cassino, o clube, a igreja e a Casa do Baile a se refletirem nas águas da represa. E Pampulha inaugurou-se, e cobriu-se de casas e jardins, de vegetação, ruídos e alegria. Era o bairro diferente que Juscelino sonhava e que tanta falta fazia a Belo Horizonte. Os que visitavam Pampulha se entusiasmavam com as formas novas que ela oferecia e a leveza de sua arquitetura. De Lucio Costa, que a visitou logo depois de inaugurada, recebi esse telegrama "Oscar, Pampulha é uma beleza". Do meu colega francês, Deroche, que encontrei vinte anos depois em Paris, esta frase sugestiva: "Pampulha foi o grande entusiasmo da minha geração". De Ozenfant, amigo de Le Corbusier, recolhi, no seu livro de memórias, este trecho claro, de destino inconfundível: "Le Corbusier, depois de ter defendido a discilplina purista e a lealdade ao ângulo reto, pelo qual pretendia direitos particulares, parece ter decidido abandoná-lo, ao sentir no vento as premissas de um novo barroco, vindo de fora, que faz justiça a ele mesmo e, como sempre, com um imenso talento".


Mas nem todos sorriam. Para os mais dotados, Pampulha era uma opção atraente, permitindo a liberdade que o funcionalismo recusava. Para outros, um caminho difícil de seguir e principalmente de conceber. Uns se aventuraram nessa tarefa e os resultados nem sempre foram satisfatórios, o que explica alguns exemplos lamentáveis disseminados pelo país; outros, mais realistas, preferiram manter-se nas soluções simples e fáceis de projetar. Mas alguns contra Pampulha se insurgiram, incapazes de nos acompanhar nas formas mais livres que propúnhamos.


E as palavras barroca e fotogênica se repetiam, vazia e gratuitas, pois os que nos contestavam nada de novo tinham a sugerir. A idéia do barroco, que Herbert Reed tão bem compreendia, resumia-se para eles num termo pejorativo cujas nuanças e significação pareciam desconhecer. A própria curva, que tanto os perturbava, era por eles desenhada de forma frouxa e desfibrada, não a sentindo, como nós, estruturada, feita com curvas e retas. Até as colunas que afastávamos dos edifícios e desenhávamos como formas livres e variadas, eles não conseguiam compreender. Um dia, contei como as projetava, como ao desenhá-las me via a circular entre elas e os edifícios, imaginando as formas que teriam, os pontos de vista possíveis de variar, etc. Meu intuito era mostrar como o problema plástico era laboriosamente pensado e como neles nos detínhamos com carinho.


(...)
Aos que contestavam explicava pacientemente as razões da minha arquitetura, dizendo, por exemplo - para evitar discussões ociosas -, que as curvas da marquise da Casa do Baile acompanhavam e protegiam as mesas localizadas junto à represa, quando na verdade eram apenas as curvas que me atraiam.


Às vezes, revoltava-me contra tanta insensibilidade, respondendo aos mais complexados que formalista era a arquitetura purista que propunham, pois antes de elaborada já a esperávamos nos seus eternos cubos de vidro, o que para mim constitui formalismo absoluto, considerando que programas construtivos sugerem, muitas vezes, soluções recortadas e inovadoras.


(...)
Mas foi em Brasília que minha arquitetura se fez mais livre e rigorosa. Livre, no sentido da forma plástica; rigorosa, pela preocupação de mantê-la em perímetros regulares e definidos. E se fez mais importante, sem dúvida, pois se tratava da arquitetura de uma Capital. Minha preocupação foi caracterizá-la com as próprias estruturas, armando os apoios com o objetivo de tomar os palácios mais leves, como que simplesmente tocando o chão, e incorporei a arquitetura ao sistema estrutural, permitindo, que, terminada uma estrutura, ela também estivesse presente, ao contrário dos prédios usuais, onde aparece depois, pouco a pouco, com a colocação dos pré-fabricados, brise-soleil, vidros, etc. Integrava-a na técnica mais avançada, no vão maior, nos balanços imensos, nela caracterizando o apuro do conceito armado.



Palácio dos Doges - Veneza, 804.

(...)

- Que você pensa do Palácio dos Doges?
- Muito bonito.
- E das suas colunas cheias de curvas?
- Belíssimas.
- Mas vocês não acha que elas poderiam ser mais simples e funcionais?
- Acho.
- Mas se elas fossem mais simples e funcionais não criariam, sem suas curvas, o contraste esplêndido que estabelecem com a parede lisa e extensa que suportam!
- Isso é verdade.
- Então, você tem que aceitar que quando uma forma cria beleza ela tem uma função e das mais importantes na arquitetura.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Flora Brasiliensis



           A Flora Brasiliensis foi produzida entre 1840 e 1906 pelos editores Carl Friedrich Philipp von Martius, August Wilhelm Eichler e Ignatz Urban, com a participação de 65 especialistas de vários países. Contém tratamentos taxonômicos de 22.767 espécies, a maioria de angiospermas brasileiras, reunidos em 15 volumes, divididos em 40 partes, com um total de 10.367 páginas. Nada mais é do que um sistema de informação sobre a flora brasileira, tendo como base as imagens digitalizadas em alta resolução das pranchas. A digitalização das imagens está sob a responsabilidade do Jardim Botânico de Missouri. Os trabalhos referentes à atualização dos nomes estão sendo coordenados por pesquisadores do Departamento de Botânica do Instituto de Biologia da Unicamp. O CRIA é responsável pelo desenvolvimento do sistema on-line. O sistema de informação é composto pelos seguintes módulos: 
  • banco de imagens das pranchas digitalizadas em alta resolução
  • banco de metadados com informações sobre o conteúdo das imagens (nome científico da planta, volume, número, página, etc.)
  • banco de dados com todos os nomes citados na obra
  • sistema com ferramentas adequadas para que especialistas possam de forma colaborativa contribuir na elaboração de um catálogo de nomes atualmente aceitos, citando, quando for o caso, a sua correspondência na obra Flora brasiliensis.

Acesso ao banco de dados em http://florabrasiliensis.cria.org.br/opus

terça-feira, 29 de junho de 2010

Sonhos na visão de Freud

            O conteúdo onírico é de suma importância para a compreensão do inconsciente de quem o produz.  Por isso a Psicanálise vê com tanta atenção este produto da mente, que é o sonho.  Gastão Pereira da Silva define o sonho de uma forma que bem demonstra sua relevância. 

           "Uma função psíquica encarregada de compensar, de suavizar, de substituir uma realidade que nos  é  hostil por  outra totalmente  diferente, onde um novo mundo se descortina  diante  da alma e onde todas as nossas ações parecem absurdas justamente porque as mais censuráveis na sociedade em  que  vivemos gozam enquanto dormimos de uma espécie de liberdade condicional quando se expandem nos sonhos."     
            As descobertas de Freud, de que os sonhos têm um conteúdo psicológico fundamental revolucionaram o estudo da mente.  Antes os sonhos eram tidos como meros efeitos de um trabalho desconexo provocados por estímulos fisiológicos.  Os conhecimentos desenvolvidos por Freud trouxeram os sonhos para o campo da Psicologia e demonstraram que estes são somente a realização de desejos, disfarçados ou não, satisfeitos em pleno campo psíquico.

            Podemos sintetizar a teoria psicanalítica dos sonhos da seguinte maneira:  a experiência subjetiva que aparece na consciência durante o sono e que após o despertar chamamos de sonho é apenas o resultado final de uma atividade mental inconsciente durante este processo fisiológico que por sua natureza ou intensidade ameaça interferir com o próprio sono.  

             Chama-se sonho manifesto a experiência consciente, durante o sono, que a pessoa pode ou não recordar depois de despertar.  Seus vários elementos são designados como conteúdo manifesto do sonho. Os pensamentos e desejos inconscientes que ameaçam acordar a pessoa são denominados conteúdo latente do sonho.  As operações mentais inconscientes por meio das quais o conteúdo latente do sonho se transforma em sonho manifesto, chamamos de elaboração do sonho.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Computação Molecular


Em cima, imagens de ressonância magnética do cérebro humano durante a execução de diferentes tarefas. Embaixo, padrões de evolução similares são observados na camada molecular que forma o novo processador orgânico. [Imagem: Anirban Bandyopadhyay]

Uma equipe de pesquisadores do Japão e dos Estados Unidos anunciou a criação de um circuito capaz de evoluir e resolver problemas extremamente complexos de forma naturalmente paralela, de forma semelhante ao que acontece no cérebro humano.

Inserido nas pesquisas da chamada computação molecular, o feito inédito representa uma mudança de paradigma em relação à atual computação digital, baseada na solução sequencial de problemas. Segundo os cientistas, o circuito molecular orgânico é a primeira demonstração prática já feita de um "circuito capaz de evoluir", inspirado no mesmo processo usado pelo cérebro humano.

Processamento neural


Os circuitos de processamento de dados dos computadores digitais são estáticos - uma vez construídos, eles serão capazes de fazer sempre as mesmas operações. Nos nossos cérebros, ao contrário, os circuitos de processamento de informações - os neurônios e suas redes - evoluem continuamente para resolver problemas novos e mais complexos. "Os computadores modernos são muito rápidos, capazes de executar trilhões de operações por segundo. Nossos neurônios, por outro lado, somente disparam cerca de mil vezes por segundo. Mas isso me permite ver você, reconhecê-lo, falar com você e ouvir alguém andando no corredor, tudo simultaneamente. Isso é uma tarefa impraticável mesmo para o mais rápido supercomputador," disse Ranjit Pati, um dos autores do trabalho. Pati afirma que o computador molecular foi ideia do seu colega Anirban Bandyopadhyay, ambos atualmente pesquisadores da Universidade Tecnológica de Michigan. Seus colaboradores japoneses trabalham no Instituto Nacional de Ciências dos Materiais e no Instituto de Tecnologia da Informação do Japão.

Processamento paralelo


As moléculas do processador orgânico podem chavear entre quatro estados condutores - 0, 1, 2 e 3 - ao contrário dos sistemas binários dos computadores digitais, que estão limitados a 0s e 1s. [Imagem: Bandyopadhyay et al./Nature Physics]

Apesar da aparente lentidão do cérebro humano em relação aos computadores - comparando a velocidade de chaveamento dos transistores (1013) e a velocidade de disparo dos neurônios (103) - os computadores atuais somente operam sequencialmente. Uma vez estabelecida uma rota ao longo do seu circuito, isto nunca irá mudar. No nosso cérebro, ao contrário, os impulsos elétricos formam vastas redes dinâmicas, que evoluem constantemente, e que operam coletivamente. É por isto que é tão difícil transportar a forma de resolver problemas do cérebro humano para os computadores. Da mesma forma, o "circuito evolutivo" deste novo processador molecular é massivamente paralelo, permitindo interconexões simultâneas de até 300 bits.

Processador molecular evolutivo


Para construir o seu processador orgânico evolucionário, os cientistas usaram a DDQ, uma molécula hexagonal feita de nitrogênio, oxigênio, cloro e carbono. As moléculas DDQ se estabeleceram por conta própria, em um processo chamado automontagem, formando duas camadas sobre um substrato de ouro. As moléculas DDQ podem chavear entre quatro estados condutores - 0, 1, 2 e 3 - ao contrário dos sistemas binários dos computadores digitais, que estão limitados a 0s e 1s. "A melhor parte é que aproximadamente 300 moléculas 'falam' umas com as outras de uma vez só durante o processamento das informações," explica Pati. "Nós realmente imitamos como os neurônios se comportam no cérebro."

Solução de problemas intratáveis



As cadeias de chaves moleculares, capazes de interagirem simultaneamente, poderão permitir a solução de problemas hoje intratáveis e para os quais não existem nem mesmo algoritmos que possam ser codificados para rodarem nos computadores atuais. [Imagem: Bandyopadhyay et al./Nature Physics]

Isto está levando os cientistas a considerarem que essa nova arquitetura, se tornada prática, será capaz de produzir soluções para problemas como a previsão de calamidades naturais ou o surgimento de epidemias - exemplos de situações complexas demais para os computadores atuais. Para demonstrar essa capacidade, os cientistas simularam dois fenômenos naturais utilizando apenas seu processador molecular: a difusão de calor e a evolução de células cancerosas. Eles também resolveram problemas de lógica clássica, incluindo os complicados diagramas de Voronoi.

Arquitetura paralela

Como é baseado em uma camada molecular orgânica, o novo processador biologicamente inspirado ainda é capaz de se autoconsertar se surgir algum defeito - da mesma forma que, quando um neurônio morre, outro neurônio assume sua função. "Além de representar uma mudança conceitual do processamento serial com arquiteturas estáticas, nossa abordagem paralela e dinamicamente reconfigurável poderá fornecer meios de resolver problemas computacionais intratáveis por qualquer outro meio," dizem os pesquisadores em seu artigo.
Bibliografia:

Massively parallel computing on an organic molecular layer

Anirban Bandyopadhyay, Ranjit Pati, Satyajit Sahu, Ferdinand Peper, Daisuke Fujita

Nature Physics